30.5.16

declaração de rendição pronta e assinada

disse-lhe: não sei o que me fizeste. podes fazê-lo de novo.

29.5.16

como areia a esvair-se das mãos

disse-lhe: o tempo não se guarda. se não se usa, passa.

28.5.16

pergunta exata de resposta certamente inexata

diz-me tudo sobre o instante preciso em que sentiste que te amava.

a acuidade visual procedente da nostalgia

sentado à janela, fitando o horizonte, viu a noite depositar-se em véus finíssimos.

o instante do desvanecimento da neblina

não sabia mais nada. apenas que seria com ela.

desvendar quase silencioso de carências

os seus melhores "faltas-me" ocultavam-se por detrás de um abraço.

27.5.16

a arte das melodias inexplicáveis

algo na voz dela parava os relógios.

ser humano das pequenas coisas

apenas precisava de um abraço de que nunca tivesse que sair.

26.5.16

redescobertas no sistema métrico

havia um centímetro de silêncio entre os lábios dele e dela.

a natural confusão entre o mapa e o território

ele achava-se um caso perdido, até que ela o encontrou.

o amante generoso

deixou que ela lhe roubasse um beijo, dois, mil.

ausências do nascer ao nascer do sol

quando abriu os olhos, faltou-lhe o sorriso dela.

25.5.16

sobre os segundos imediatamente precedentes

invadiu-o uma serenidade suprema. então depôs-se.

comissão instaladora do instituto dos novos sentimentos

aprendeu a nostalgia por correspondência.

um dúvida premente e irresolúvel

nunca soube onde terminava o olhar e começava a carícia.

breve ensaio sobre o desconhecimento

ele foi mudando sem se aperceber. por vezes reconhecia-se aqui e ali. mas acabou por reconhecer que nunca se conheceria totalmente.

24.5.16

guia de viagem do escritor perante a sua musa

escrevia a pensar nela. parava para recordá-la. recomeçava.

ponto de chegada, ponto de partida

bastou um relance para entenderem o óbvio. haviam-se pensado toda a vida.

décadas de ciência e magia

no dia em que inventou a máquina do tempo, beijou-a no recreio.

23.5.16

fragmento encontrado no fundo de uma gaveta centenária

teve então a certeza de que se o amor tivesse forma, era a dos olhos dela.

provérbios esquecidos

salve-se quem perder.

frente a um céu salpicado de branco

quedava-se escutando o silêncio, aguardando o som de um abraço.

22.5.16

arquivo vivo de letras perdidas

ela não sabia que era a biblioteca dos poemas dele.

mecânica insensata de fluídos

virou o relógio de areia com a esperança de que o tempo recuasse. iludido.

jograis, trovadores e outros olhares

ela tinha o olhar mais bonito que ele alguma vez ouvira.

se isto é um homem frente a si próprio

o espelho deu-lhe, sem surpresa, a sua imagem exata. era feito de espaços em branco.

depois do nascer do sol

sentiu-a despertar no lado esquerdo do pensamento dele.

21.5.16

atlas sentimentais

conhecia-a bem, por tê-la imaginado desde sempre.

evento determinante na história dos dois

frente a ela, desarmou-se em legítima defesa.

sentir o mundo completamente

queria caminhar descalço ao lado dela.

o desenho do futuro na areia

guardaram um agora para mais tarde.

20.5.16

distorções no sistema métrico

à nostalgia media-a em quilómetros.

teoria da irrazoabilidade geral

a distância mais curta entre dois pontos era a ânsia por estarem juntos.

mares longínquos

queria-a a navegar no oceano de possibilidades dele.

vidas rápidas

cuidado: transporte de sentimentos frágeis.

19.5.16

um elo de corrente

juntava-os o medo de serem separados.

18.5.16

usucapião

ainda crianças quiseram um dia chegar à lua. já adultos, depois de se conhecerem, chamaram à lua deles.

16.5.16

progresso imparável

cada vez que falhava, falhava melhor.

15.5.16

brisas de primavera

sim, ele queria uma segunda oportunidade com ela mas, mais do que isso, queria uma primeira.

14.5.16

as escolhas do dia

ao olhar o céu preferiu pensar que o dia decidira manter-se vestido de tule.

13.5.16

lugar de conforto

as saudades acolheram-se-lhe sob as pálpebras.

10.5.16

antevidentes

quando se encontraram por fim perceberam, num olhar, todos os impossíveis passados, todos os possíveis futuros.

9.5.16

arte de voar

notou que no sorriso dela se desenhavam asas de gaivotas ou de anjos.

aprender a intensidade

beijou-a até se tornar a outra parte dela.

8.5.16

o fim da inocência

o dia em que hesitamos antes de perguntar porquê.

a extensão das palavras

a cada palavra que lhe escrevia sentia um arrepio na pele.

7.5.16

escrita da razão pura

escrevia para saber em que estava a pensar.

enquanto chove

por detrás da chuva há um sol à espera de se molhar.

saber a mar

todos fomos mar: isso explica o inexplicável.

nova regra gramatical

descobriu que o plural dele era ela.

6.5.16

a volta do navegante

só partia pelo regresso: tudo o que buscava eram os braços onde se acostava e os olhos onde fundeava os seus.

5.5.16

traje de encontro

para estarem juntos, vestiam-se das suas melhores palavras.

2.5.16

enquanto o olhar

até onde o olhar dela alcançava, estava calor. o frio começava logo a seguir.

1.5.16

antes de acontecer

nem no mais longínquo dos seus pensamentos alguma vez a imaginou assim: não estava na sua natureza acreditar em milagres.