15.2.15

flagrante devido

atravesso o parque em direção ao edifício grande. não é para ele que me dirijo, mas é para ele que aponto os passos. mesmo ali, tenho uma câmara nos olhos. procuro um ângulo, um pormenor, algo, que ainda não tenha captado em papel de nunca. 

esta semana já passei por aquela árvore. esta, e na semana anterior também. a árvore vê-me passar com frequência e hoje, dos troncos cinzentos, brindou-me com dois botões, de um tom de pétala de rosa deixada ao embalo do sol.

vejo a minha fotografia da manhã, pulo para cima do muro, estão altos os botões. é difícil isolá-los, com a câmara do telefone, mala na outra mão, instabilidade de quem quer capturar a parte sem o todo, o todo sem a parte.

abaixo, passa um sobretudo preto, com óculos de massa, pretos. olhamo-nos e ele, mais novo que eu, não mostra espanto, ou não o denuncia.

apanha-me só em flagrante, a apanhar a vida em flagrante.